No passado dia 15 de setembro comemorou-se o Dia do Serviço Nacional de Saúde. Por certo uma comemoração sem celebrações dignas de registo, atendendo ao número crescente de portugueses sem óbvias motivações para celebrar.
Apesar dos progressos verificados – Portugal tem um dos melhores indicadores de Saúde -, a verdade é que as políticas de saúde desenvolvidas nas últimas duas décadas têm sido um desastre, continuando a ser enormes as dificuldades de milhares de utentes para acederem aos normais cuidados de saúde.
Apostando-se desde há algum tempo a esta parte, e agora e de uma forma mais incisiva, na criação de novas e mais modernas Unidades de Saúde Familiar, a verdade é que a crónica falta de médicos e de outros profissionais da saúde irão continuar a ditar que os problemas futuros não serão diferentes dos actuais, sendo previsível que o panorama actual vigente dificilmente deixará de nos acompanhar e de apoquentar neste e nos anos seguintes.
E é no quadro do panorama actual que irão residir os problemas futuros, onde o novo regime de dedicação plena entretanto anunciado acolhe desde já abundantes condimentos para que se venha a constituir num provável fracasso.
Com a falta de médicos que se conhece e estes com uma grelha salarial desfavorável que só agrava as suas condições de trabalho; com serviços obsoletos; com as constantes filas de utentes e essas sempre em crescendo às portas de muitos Centros de Saúde e das Unidades Hospitalares um pouco por todo o país; com mais utentes sem médicos de família; com enfermeiros mal pagos e desmotivados; com técnicos farmacêuticos hospitalares sem revisão das suas carreiras e das grelhas salariais há mais de vinte anos e com mais de quatrocentos médicos com idade igual ou superior a sessenta e cinco anos dentro do sistema, será de esperar que sejam mais os médicos vocacionados para abandonar o SNS do que o contrário, tanto mais por ser muito forte o aliciamento constante por parte dos privados e aqueles não quererem correr o risco de perderem óptimas oportunidades para nos últimos anos das suas carreiras aumentarem os seus rendimentos e respectivos descontos para o sistema, tendo em vista a obtenção de melhores valores à data em que se decidirem pelas suas aposentações.
O valor das suas futuras pensões, que há data já se encontram afectadas pela falta de pagamento de salários dignos, não se compaginam mais com a grelha salarial vigente e nem sequer com aquela que agora lhes querem impor, 3,3% de aumento nos seus ordenados, razão pela qual o desencadeamento e o desenvolvimento das lutas actuais dos médicos, dos enfermeiros e dos técnicos farmacêuticos nos últimos meses e a suas renovadas disponibilidades para endurecimentos futuros.
Perseguir um ideal ou uma política de conquista de dedicação plena no que respeita à classe médica, implica, antes mais, um aumento significativo dos seus salários-base, a par de uma redução da carga de trabalho, o que passa pela redução das listas de utentes actualmente atribuídas a cada um, não se esquecendo, jamais, o desígnio do que ainda falta fazer e investir para se obterem melhores condições de trabalho, quer em inúmeros Centros de Saúde, quer nas mais diversas Unidades Hospitalares.
Por conseguinte, apontar com aumentos generalizados tão baixos para a classe médica sobre os seus vencimentos actuais não serve o objectivo de melhorar o Serviço Nacional de Saúde, pelo que será importante atalhar outro caminho.
E não sendo despiciendo proclamar que os problemas para a saúde carecem de um resgate global, impor-se-á dizer que as soluções passam decisivamente por uma nova política, e que no entretanto, neste início de um novo Outono, não deixemos que as nuvens nebulosas que tanto baloiçam no nosso espaço, continuem a enegrecer a saúde dos nossos dias.
José Quintela
