De facto, não há dúvida nenhuma que, em Portugal, somos mesmo muito pouco exigentes – até mesmo nas polémicas, que só duram até à seguinte ou até nos dizerem que, afinal, está tudo bem. Senão vejamos.
Ficamos todos muito indignados (não vou aqui discutir se bem ou se mal), quando tivemos conhecimento que o Município de Lisboa iria pagar 4,2 milhões de euros pela obra de construção do altar-palco onde o Papa Francisco irá celebrar a missa, nas Jornada Mundiais da Juventude. Um número pecaminoso, considerando os problemas económicos que assolam o país, alegava-se. Tomou-se o caso como um crime de lesa-pátria até que, graças a Deus, recebemos a notícia de que a referida construção teve uma redução de custos para os 2,9 milhões de euros. Perfeito, fica assim resolvida a história.
Agora, pergunto-me: mas porque é que 4,2 milhões era muito dinheiro por um altar-palco e 2,9 milhões já não o é? Isso também não interessa nada, a história já está “resolvida”.
Por outro lado, ficamos, igualmente, todos muito indignados quando tomamos conhecimento de que havia sido paga a uma ex-administradora da TAP uma indemnização de 500 mil euros para sair dessa empresa pública, sendo que essa ex-administradora, meses mais tarde, veio a assumir idênticas funções numa outra empresa pública, onde se manteve até ser promovida a Secretária de Estado do Tesouro. Um número obsceno, considerando os problemas económicos que assolam o país, alegava-se. Volvidos uns meses, eis que surge um relatório que concluiu que a indemnização paga à ex-administradora Alexandra Reis era ilegal e, por consequência, o Governo toma a decisão de “destituir” a Presidente do Conselho da Administração da TAP – que, de resto, tinha a concordância do próprio Governo para pagar essa mesma indemnização.
Agora, pergunto-me: mas, então, o problema era a questão da (i)legalidade da indemnização? Se o relatório concluísse pela sua legalidade, a indemnização já não seria obscena e a Sra. Presidente ter-se-ia mantido no cargo? Isso também não interessa nada, interessa é que o assunto está “resolvido”. A propósito: e se se der caso, aliás provável, de o Estado ser condenado a pagar uma indemnização à agora Ex-Presidente do CA da TAP? Desde que seja legal, parece que ninguém levará a mal.
Enfim, nem vale a pena pensar nisto, até porque, está visto, somos muito melhores a ouvir (e a pagar) do que a exigir.
Manuel Maria Machado