O outro lado da história
21 de junho de 1995. Um grupo de lixenses, composto por dirigentes da Apromolixa – Associação para a Promoção da Lixa e autarcas das freguesias da então Vila da Lixa, rumou bem cedo a Lisboa para assistir na Assembleia da República à votação da elevação da Lixa a cidade. Pouco antes do meio dia, Barbosa de Melo, presidente da Assembleia da República, anunciava o que os promotores do projeto ansiavam há anos: a elevação da Lixa a cidade.
Entre a comitiva lixense estava Carlos Coelho, o célebre cronista da cidade que não conteve as lágrimas nas bancadas do Hemiciclo. O projecto de lei 411/VI, cujo primeiro subscritor foi Rui Rio, atual líder do PSD, tinha começado a ser desenhado anos antes e manteve-se em segredo muitos meses. Os dirigentes da Apromolixa e os presidentes das Juntas de Freguesia de Vila Cova da Lixa, Borba de Godim e Santão, mantiveram vários contactos com o deputado eleito pelo círculo eleitoral do Porto para que patrocinasse o “sonho”. Rui Rio foi apresentado aos homens da Lixa por José Lachado, na época, autarca social-democrata no Porto, com ligações familiares à Lixa.
Além de Rio, José Puig, Acácio Roque, Luís Geraldes e Joaquim Vilela Araújo, assinaram o projeto admitido em 12 de maio de 1994 e votado a 21 de junho de 1995, tendo sido aprovado por unanimidade.
Os meses anteriores a junho de 1995 foram de trabalho político. Em causa não estava apenas a elevação a cidade. Havia um outro objetivo mais ambicioso e fraturante: a pretensão da Lixa ser concelho. Tal como a Lixa, havia um conjunto de terras que queriam a “independência” em relação aos concelhos de origem, tal como Ermesinde, onde viria a ser constituída a associação Promunicipales, que congregava as cidades potenciais municípios que até meados do ano 2000 encetou contactos para “emancipar” as localidades fundadores, entre as quais a Lixa.
Vizela, não sendo cidade, estava fora deste lote, mas era quem tinha mais hipóteses de ser independente de Guimarães, o que viria a acontecer em 1998, depois de décadas de luta e de uma promessa do Partido Socialista liderado por António Guterres. O caso de Vizela dava ânimo à Lixa e a outras localidades, como a Trofa, do concelho de Santo Tirso, que conseguiria ser concelho no final de 1998. Mas ficaram por aqui as terras que conseguiram que a Assembleia da República aprovasse a sua pretensão.
Neste contexto, no caso da Lixa, havia quem mantivesse reservas sobre o primeiro passo do plano que passava pela elevação a cidade para depois se tentar a criação do concelho. A Câmara Municipal de Felgueiras, na altura liderada por Júlio Faria, eleito pelo Partido Socialista, e a Assembleia Municipal, de maioria cor de rosa, sabiam que a Apromolixa, se movimentava nos bastidores com o objetivo da Lixa se emancipar. Mesmo assim, o executivo municipal e a Assembleia pronunciaram-se favoravelmente sobre a elevação da Lixa a cidade.
A 18 de abril de 1985, a Apromolixa dirigiu à Câmara uma carta onde apelava à urgência da pronúncia para que fosse possível remete-la para a Assembleia da República, o que demonstra o cuidado com que o poder político lidou com a questão. Na Lixa, o PSD tinha força. Em todos os atos eleitorais, os social-democratas venciam com larga maioria, daí não ser de estranhar que tenha sido um grupo de deputados do PSD a apresentar o projeto de lei na Assembleia da República.