“Era uma vez um grupo de jovens destemidos, que não receavam enfrentar as tempestades e todos os Adamastores, gostavam de dobrar os cabos, todos os cabos Bojadores, e traziam no coração, largo e generoso, um episódio ainda por escrever, que é fazer uma escola (…). Esse episódio está-se a criar com estes jovens, com a comunidade, com o poder local.”
São da Lixa e integram o GRITAH – Grupo de Intervenção e Ação Humanitária. Atualmente com o estatuto de Organização Não-Governamental para o Desenvolvimento (ONGD), o GRITAH surgiu formalmente em 2014 como um grupo de jovens imbuído de espírito associativista e com o sonho de construir uma escola na Guiné-Bissau. Se passados onze anos falamos (novamente) sobre eles, é porque estes jovens, firmes no seu propósito, ultrapassaram os limites do sonho, e a construção da desejada escola está cada vez mais perto de acontecer.
“Todos os passos que nós fomos dando até aqui de angariação de fundos, contactos com a comunidade [em missões voluntárias na Guiné-Bissau], estão agora realmente a efetivar-se. No final de 2024, fizemos a limpeza do terreno onde vamos construir a escola, e neste momento estamos numa fase de conclusão [do projeto de arquitetura], com pedidos de licenciamento no governo da Guiné, e portanto dentro de poucos meses, a construção vai mesmo iniciar.”, conta-nos Daniela Teixeira, vice-presidente do GRITAH.

É em colaboração com uma congregação mexicana de irmãs franciscanas da Imaculada Conceição, presentes na Guiné-Bissau, que tem sido levado a cabo o propósito material de construção da escola neste país. Para além deste propósito, desde a sua fundação que o GRITAH tem como objetivo a promoção dos Direitos Humanos. É sobre eles a mensagem que sempre procura passar nas atividades que organiza, nas intervenções que faz ou nas presenças que marca. A Cultura, como lema, surgiu numa fase posterior da evolução deste grupo, como explica Daniela: “A Cultura aproxima-nos e faz-nos conhecer a nós melhor e aos outros. E conseguirmos através da Cultura promover a Educação e os Direitos Humanos para nós é uma vantagem, e portanto é que tentamos que as nossas atividades tenham sempre esta componente, porque achamos que é uma forma mais rápida de chegarmos às pessoas com uma mensagem, ligada aos Direitos Humanos e às nossas causas”.



Jozé Sabugo é um contador de histórias e amigo do GRITAH, alguém que tem inspirado o grupo e contribuído para estimular a sua sensibilidade cultural. É dele a citação que dá início a esta peça, e é ele quem nos conta sobre a escola do futuro: “é o saber-fazer, temos de saber-fazer para poder ter um pensamento crítico”, numa “escola que é um centro cultural, um centro cívico, um centro de artes, um centro de Direitos Humanos”.
As vontades da comunidade de Cúmura, na Guiné-Bissau, onde será construída a escola do GRITAH, não poderiam ir mais de encontro às palavras de Jozé Sabugo. A escola que a comunidade local imaginou em conjunto com o GRITAH é “um espaço aberto a todos, agregador da comunidade, um centro cívico de Direitos Humanos, um espaço que não é só para as crianças aprenderem a ler e a escrever”, mas onde se trabalha também a educação não-formal e se valorizam outras experiências. “Estando a escola construída, a escola cumpre o seu propósito de educação formal, que é a parte em que as irmãs têm maior envolvimento, e o GRITAH pretende ser aqui o promotor da comunidade, e desta componente da educação não- formal, com oficinas, workshops ligados às artes, exposições … E que os voluntários possam ir ao longo do ano (…) Alguém que goste de música possa ir para dar formação ou workshops a jovens ou a adultos, e ir também capacitando a comunidade para que eles possam continuar esse trabalho mesmo quando nós não estamos tão presentes. ”
A missão do GRITAH pretende ter impacto não só na Guiné-Bissau, mas também no nosso território. Para além das atividades de angariação de fundos junto da comunidade felgueirense, o grupo tem realizado várias atividades de sensibilização e educação para os Direitos Humanos nas escolas da região. Dinamiza também um grupo de teatro, aberto à comunidade, que se recria e organiza sempre que existe a oportunidade de trabalhar e usar a expressão dramática para passar uma mensagem sobre Direitos Humanos.
No passado dia 3 de maio, com a realização da primeira edição da Oficina de Artes e Direitos Humanos, o GRITAH lançou uma nova semente no seu território de origem, a Lixa. Daniela Teixeira conta-nos o que aconteceu: a Oficina foi “um encontro, entre a arte, a comunidade e o território, (…) um espaço para as pessoas se encontrarem, partilharem e co-criarem. Juntámos ali várias pessoas, de várias idades… Foi assim um envolvimento intergeracional, em que promovemos a participação ativa das pessoas, a partilha de saberes”. O dia começou com uma caminhada ao Seixoso, “para criar a ligação com o território e a memória histórica daquele lugar”. Depois, e durante todo o dia, na sede do GRITAH – a antiga Escola Primária de Vilar, em Borba de Godim, na Lixa – decorreram variadas oficinas artísticas dinamizadas por voluntários. Entre outras coisas, estas oficinas deram início à transformação da sede do GRITAH num espaço de encontro para a comunidade, em paralelismo com aquele que se constrói para a comunidade da Guiné: “nós temos a escola lá, e cá na nossa sede, que é uma antiga escola, também a estamos a promover agora desta forma, para ser também um espaço para a comunidade, fazendo aqui esta ligação entre Portugal e a Guiné”. Foi iniciada a pintura de um mural cujo tema “reforça o nosso compromisso com estes dois territórios e o intercâmbio cultural que nós também queremos promover”, e a construção de um forno comunitário em adobe, “que é uma terra argilosa usada para a construção de tijolos e muito usada também na Guiné-Bissau” e existente no Seixoso.
O que se viveu na Lixa, com o GRITAH, foi “o presente a fazer o futuro”, como relembra Jozé Sabugo, diretor artístico da Oficina. E o que se pretende é que a comunidade participe desse futuro, “porque os artistas somos todos, e no fundo há sempre alguma coisa que podemos partilhar. As portas abrem-se e o GRITAH está com as portas sempre abertas”.
Para este ano de 2025, a par do início da construção da escola na Guiné, o GRITAH está a preparar um evento de apresentação deste projeto para a comunidade regional do Tâmega e Sousa. Uma nova data para uma nova Oficina de Artes e Direitos Humanos será previsivelmente divulgada, e mais visitas a escolas na região ocorrerão. Todas as datas serão divulgadas nas redes sociais do GRITAH, onde se divulgam também as chamadas para a participação da comunidade nas diferentes atividades.
Vale a pena lembrar que o GRITAH vive de donativos de empresas ou particulares. Os dados para doação podem ser encontrados no site do GRITAH e este ano a ONGD já é elegível para a consignação do IRS. Toda a verba angariada serve para apoiar o projeto de construção da escola na Guiné e apoiar o GRITAH no seu propósito de Educação e Cultura ao serviço dos Direitos Humanos.
Mariana Costa