O recente escândalo envolvendo um deputado do Chega, acusado de furto de malas no aeroporto, é uma demonstração brutal da dissonância entre o discurso inflamado e a prática real. O partido, que se arvora um defensor intransigente da ordem e da moralidade, tropeça na sua própria retórica, expondo uma fragilidade que ultrapassa o mero acaso e denuncia um padrão sistémico. É fácil pregar a moralidade a plenos pulmões; difícil é vivê-la.
Erigido como bastião do combate à corrupção e à decadência do sistema, o Chega vê agora a sua máscara moralista escorregar, revelando uma incoerência estrutural que não apenas desacredita o partido, mas escancara o abismo entre a promessa de redenção e a realidade dos seus quadros. Este episódio não é um deslize isolado, mas o reflexo de um projeto político incapaz de sustentar o peso das suas próprias proclamações.
A lógica populista sobrevive de uma retórica vazia, feita para galvanizar descontentes, mas que invariavelmente desmorona quando confrontada com a exigência de coerência. Ao falhar até mesmo na gestão interna, o Chega expõe-se como mais um ator político movido por ambições oportunistas, distante da integridade que tão veementemente apregoa.
Este episódio é um alerta severo: o populismo, frequentemente disfarçado de purismo redentor, tende a reproduzir – ou mesmo amplificar – os mesmos vícios que diz combater. Se o Chega aspira a ser algo mais do que uma caricatura, terá de expurgar os seus próprios vícios e demonstrar que é capaz de se diferenciar, não no discurso, mas, na prática. Sem isso, continuará a não ser mais que uma peça previsível no teatro da política oportunista, ávida por poder e desprovida de substância.
Bruno Fonseca Lobo