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Uma mulher de sonho (um conto de Natal)

Desta vez, o episódio passou-se em Vila Viçosa, onde o jantar já se encontrava previamente marcado.

Com alguns minutos de atraso, Sebastião saiu da sua casa para recolher Eufrásia.

E quando lhe ligou para ela descer, a mesma já se encontrava à porta do prédio onde reside, não apenas pronta, mas também algo ansiosa para sair de casa.

Nesse dia, Eufrásia fazia anos, por sinal, bastantes, mas atendendo à sua  jovialidade, poucos, à luz dos mais que ainda queremos que venha a ter.

Tendo nascido numa povoação do interior, onde o nome da mesma é igual ao seu, Eufrásia imigrou muito cedo para Lisboa, onde, logo, logo, começou a trabalhar num hospital.

Nesse, depressa se tornou governanta, sendo-lhe muito cedo confiada a chave da respetiva Copa.

Mais tarde trabalhou num Hotel, onde ao fim de algum tempo foi vítima de uma violação, da qual resultou o nascimento de uma criança, devidamente por si aceite, mas não desejada.

Criança essa, que por razões de futuros trabalhos se viu compelida a confiar à sua família mais direta, tendo o crescimento e a educação dessa ficado a cargo dos seus pais.

Ferida e revoltada com o que lhe aconteceu, Eufrásia desiste de Portugal, tendo começado a preparar-se para emigrar.

E assim foi. Com pouco mais de 20 anos, Eufrásia emigrou para o centro da Europa, onde se manteve até à idade de Reforma, num país que continuou a visitar, não só para cumprir obrigações legais, mas, também, para “matar” saudades.

Não, sem antes ter sido vítima de uma nova tentativa de violação, desta feita numa região campina do país, onde outro cabrão, que tinha como missão abastecer o “seu” Hospital no domínio de bens hortícolas, depois de uma visita com outra colega ao Alentejo, no regresso, quando já descartado dessa colega, tudo fez para obrigar Eufrásia a ter relações sexuais com ele, felizmente, sem o ter conseguido.

Já sozinhos, o promitente violador começou a dar sinais do que pretendia, pousando constantemente a sua mão direita sobre as pernas e outras partes do corpo da jovem Eufrásia.

Perante a relutante recusa desta, o cabrão não parava de insistir, até que a dado momento, reunindo as forças que lhe foram possíveis, Eufrásia , com o veículo em andamento, conseguiu saltar para fora do mesmo, fugindo, perdida, sem rumo e sem norte.

Só que, temendo que Eufrásia o denunciasse junto da administração do hospital e com isso perdesse a ligação e o negócio que tinha com o mesmo, o meliante voltou a capturar Eufrásia, agora já não para a obrigar a ter relações sexuais com ele, mas, tão só, com o propósito de se desfazer dela.

De tal maneira que, um pouco mais à frente, pegando nela a peso – Eufrásia era à época uma menina muito frágil, magra e de baixa estatura -, não teve qualquer pejo em atirá-la para dentro de uma lezíria muito verde e de bom pasto, rodeado com muros muito altos, encimados e ornamentados com potentes redes de arame farpado, onde todos os dias, dezenas de touros bravos faziam as suas refeições, esperando seguidamente que esses a matassem, acabando por a comer.

Só que Eufrásia, destemida como sempre foi e assim se mantém, depressa   reuniu forças bastantes para protagonizar uma solução, e subindo  pelo lado de dentro do respetivo muro, do alto do mesmo, lá conseguiu saltar por cima do referido arame farpado, e depois de torneado esse, para o lado de fora da rua, caindo, exangue,  na estrada.

Muito ferida e completamente exausta, Eufrásia, sem saber como, conseguiu chegar ao seu local de trabalho, sendo escusado dizer que, depois de denunciado junto da sua colega e da administração, o candidato a “abusador” não só perdeu o negócio, como, e também, a consideração e o respeito que antes lhe dispensavam todo o corpo hospitalar.

Depois de emigrar, Eufrásia ainda chegou a pensar mudar-se para outro país, não só por assediada para uma vida profissional melhor, mas, também, para procurar viver o amor, já que no pressuposto dessa mudança, não só residia a promessa da construção de uma nova vida profissional, mas, e sobretudo, a possibilidade de um prometedor começo de uma vida familiar.

Porém, Eufrásia, sentindo-se já realizada no país que antes escolheu para trabalhar, não ousou viver nova aventura, mantendo-se no mesmo hotel e dentro da vida que tinha, e onde, profissionalmente, chegou a conhecer e a relacionar-se com António Guterres e Pinto Balsemão, bem como com as suas esposas.

Nas diversas funções que abraçou, todos gostavam muito dela, a qual, não tendo dado prioridade à constituição de família, sempre viveu a trabalhar, muito e até em demasia, para ter hoje o pecúlio que se lhe conhece, não tendo vivido o amor e sem que alguma vez tenha emprestado qualquer espaço ao trabalho para viver o amor.

Constituiu, contudo um significativo pecúlio patrimonial, o qual irá ser rapidamente desbaratado pela gula de alguns componentes da sua família, os quais não lhe tem amor e que quotidianamente já só vivem a pensar no dia seguinte ao da sua morte.

Tendo já sofrido uma ameaça de morte por parte de quem menos merecia e jamais esperava e um inusitado recado por parte de uma neta que só já vive a pensar que daqui a dois anos irá pagar todas as contas por dívidas entretanto  contraídas – o máximo de tempo que ela já calculou ter de vida a sua avó -, Eufrásia,  não consegue ter uma vida tranquila,  o que a leva frequentemente a afastar-se do meio social onde reside,  por não querer ou não poder coabitar com alguns dos seus familiares.

«A minha mãe é a mulher mais rica de Vila Viçosa», gabou-se estrondosamente o seu principal herdeiro, quando, um dia, por forma irregular, tomou conhecimento do património da mesma, não vendo quanto desde aí a passou a fragilizar e a desproteger, com tamanhas barbaridades pela ruas e cafés da região.

Contudo, Eufrásia é uma mulher forte, como forte tem sido toda a sua longa vida, tendo que procurar frequentemente outros espaços e refúgios para poder continuar a viver com algum sossego.

Tendo descendente direto, Eufrásia não tem o amor desse, e entre as netas, só por parte de uma consegue encontrar algum carinho.

Tem, contudo, o amor da sua irmã, que a adora, e o especial carinho do seu sobrinho, sentimentos esses que têm sido fundamentais para ela manter o caminho trilhado, e aquele, agora menos, que lhe falta percorrer.

É uma mulher obstinada, não obstante a fragilidade física que patenteia.

Sempre muito bonita, Eufrásia é uma mulher que fala e veste bem, sendo simultaneamente um torpedo de doçura.

Apesar da família que tem, Eufrásia tem por vezes que se afastar de alguns elementos da mesma para poder viver com alguma tranquilidade o tempo e a vida que tem. Assim tem sido e assim sucederá neste Natal.

Sebastião encontrou Eufrásia há alguns anos, algures num bonito recanto junto ao Castelo de Vila Viçosa, não a tendo esquecido, jamais!

Sua mulher e Sebastião gostam muito dela, prometendo-lhe, não raras vezes, que será seu propósito, e enquanto ela quiser, permanecerem ao seu lado. Dure ela dois, dez ou mais anos.

É uma mulher fabulosa, a qual irão guardar para sempre nos seus cérebros e corações.

Não tendo conhecido o amor, Eufrásia é uma mulher de sonho!

Não sendo o Natal perfeito e podendo o mesmo até causar ansiedade – como  é o descrito caso -, este ano, Sebastião e a sua mulher vão procurar estar mais perto desta grande senhora, aquela que constantemente lhes tem vindo a dizer que agora também são a sua família, mostrando-lhe através dos seus gestos e da suas companhias mais contínuas, que, neste Natal, Eufrásia não irá estar sozinha, por ser para eles um gosto muito grande e uma subida honra tê-la por mais tempo junto deles, mimando-a e abraçando-a durante todos estes dias, dentro deste seu novo ninho familiar.

José Quintela  

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